Discípulos da sombra de Jesus

17 janeiro 2008

Jesus nunca fez força para escrever nada em pedra, nem mesmo em tinta, e até quando se referiu ao Evangelho em relação às novas gerações, Ele disse: "Onde quer que esse evangelho for 'contado', isto será 'lembrado'..." E disse: "Fazei isto em memória de mim". E afirmou: "O Espírito vos fará 'lembrar' de tudo o que eu vos disse...".

Ele cria mais no "arder do coração" estimulado pela revelação Dele nas Escrituras, do que em qualquer estudo da Escritura que não faça "arder o coração" pelo caminho. Ele ensinou isto no caminho de Emaús.

Os Seus primeiros discípulos não discutiam religião e nem coisa alguma acerca de Deus com Jesus. Não se vê um único apóstolo, durante o tempo em que com Ele estavam no caminho, que lhe tenha pedido alguma explicação especial acerca das Escrituras. E quando fazem a Ele alguma pergunta, sempre é do tipo: "Não dizem os anciãos...?; ou: "Dizem os fariseus..."

No mais, todas as questões deles são sobre o mundo real ou as esperanças de todos. Eles não tinham nada mais para ver, saber, observar, e seguir para além de Jesus.

Somente tempos depois da Ascensão de Jesus aos céus, e, pela necessidade de responder aos Judeus acerca de sua fé, é que usaram as Escrituras para afirmar que Jesus era o Cristo. E, ao fazerem-no, certamente apenas se lembravam de tudo aquilo que Jesus mesmo lhes expusera no caminho, ou enquanto comiam e bebiam com Ele, mostrando tudo o que a Seu respeito contava em todas as Escrituras. E isto aconteceu apenas depois que Ele ressuscitou de entre os mortos. Não antes!

Assim, os discípulos originais de Jesus não o enxergavam a partir das Escrituras, mas justamente o contrário: eles liam agora as Escrituras a partir de Jesus.

Ou seja: enquanto andavam com Ele, apenas o ouviam, viam e tocavam, conforme João afirma em sua primeira epístola. E, além disso, o próprio Jesus os ensinou que primeiro tem-se que conhecer o Evangelho, que é Cristo Jesus; e, só então, as Escrituras poderão ser lidas sem fazer mal a alma. Sim, pois os fariseus e outros, as liam todos os dias, a partir dela própria; e, por isto, não a viram cumprir-se em Jesus, bem diante dos olhos deles.

Por isto, somente os não "pré-condicionados" pelas interpretações das Escrituras conforme a religião judaica, parecem ter tido menos dificuldade em Nele ter fé; mais fé do que qualquer cidadão de Israel, como o Centurião ou a Siro-Fenícia.

No entanto, quando não se tem tal entendimento, lê-se o Evangelho a partir das Escrituras como um todo; e, assim, Jesus fica dentro da camisa de força da Escritura, especialmente porque muito da Escritura, era "sombra do que haveria de vir" — e veio, em Jesus! Além disso, há ainda uma outra parte da Escrituras que já foi declarada como "obsoleta", e como algo que "caiu em desuso", conforme Paulo — que usa até termos mais fortes, ao dizer que tais coisas da carne e da justiça-própria, "morreram" —; e isso também de acordo com o escritor de Hebreus.

"Tais coisas eram 'sombra' do que haveria de vir" — é o que se diz.

No entanto, quando se lê o Evangelho a partir desse 'todo da Escritura', toda essa "sombra", continua vigente, e todas as coisas feitas "defuntas" no Evangelho e na Cruz, levantam-se de entre os mortos a fim de atormentarem as almas "cristãs".

Portanto, durante muito tempo, os discípulos seguiam assim... apenas olhando para Jesus; e, depois, apenas lembrando e vivendo conforme o ensino de vida de Jesus. Desse modo, o Evangelho ia de história em história, de testemunho em testemunho, e de muita revelação do significado do Evangelho para a pacificação do ser.

Mas quando as filosofias gregas se tornaram o método de leitura da Escritura, já tendo havido a prevalência do espírito de um híbrido cristão nascido em Jerusalém, e que era o casamento de Tiago com os sacerdotes judeus que se haviam convertido à fé, mas não haviam abandonado os "ritos antigos" — as sombras —; criou-se a oportunidade histórica para se fazer a maior subversão que já foi feita à fé genuína conforme o Evangelho.

E que subversão foi essa?

Ora, o sacerdotalismo cristão de Jerusalém estabeleceu a prioridade de se ler Jesus a partir das Escrituras, e, os doutores da Igreja, que já haviam sido cooptados pelo método grego-aristotélico, encarregaram-se de "construir um Jesus" que tem mais "da sombra" do que de Jesus. Ou seja: de Deus Encarnado em Cristo Jesus.

Assim, os doutores agora já da "igreja", crentes que o método grego era uma mediação útil a leitura das Escrituras, e, como conseqüência, ensejando a possibilidade de se sistematizar a Verdade como algo "científico", partiram para "ler Deus" a partir do todo da Escritura; ao invés de apenas crerem no que Jesus dissera: "Quem me vê a mim, vê o Pai".

A subversão mais perversa e sutil foi essa: Jesus deixou de ser a chave hermenêutica para a leitura e entendimento do espírito da Escritura; e a Escritura passou a ser o "ambiente regulamentar" das liberdades dos movimentos de Jesus; e, sobretudo, dos crentes.

Ou seja: Jesus se tornou, gradualmente, menos importante do que a "Sombra". Posto que boa parte da produção da "igreja" — ou toda ela —, do ponto de vista da ciência teológica, é algo construído tendo Jesus como Salvador, e a Sombra como agente santificador.

A Sombra virou a Moral da "Igreja"! E sua neurose também!

Ora, tudo isto parece sem importância. Porém, é isso que o diabo deseja manter como ortodoxia para a "igreja". Pois, enquanto for assim, o povo permanecerá sob "o peso de obras mortas"; visto que "o sacrifício de bodes e de touros" psicológicos, não são suficientes para fazer remissão definitiva dos pecados.

E digo isto porque o que resultou dessa perversão foi a volta existencial à "Sombra", visto que onde a "Sombra" é valorizada, Aquele que é a realização de "tudo quanto haveria de vir", Jesus, passa a ser apenas o triunfo da Sombra; posto que agora Ele apenas dá nome àquilo que Ele mesmo morreu para matar definitivamente para todos os homens.

Outro sério problema de ler Jesus a partir da Escritura, e não o contrário, é que é impossível haver unidade no Espírito no vinculo da paz.

E por quê?

Ora, é que ler a Escritura a partir de Jesus, nos faz todos ver a mesma coisa inequívoca: Jesus, conforme os evangelhos. Todavia, olhar para Jesus a partir das Escrituras, faz Jesus ter tantas faces quantas "montagens teológicas e doutrinárias" se conseguir dogmatizar ou sistematizar.

E eu lhe garanto: a partir da Escritura como um todo, e usando o método grego de dogmatização, sistematização, e lógica; pode-se construir, literal e infinitamente, qualquer coisa, qualquer Deus, qualquer Cristo, qualquer Jesus, qualquer idolo.

E a prova definitiva do que digo é a própria História de Confusão do Cristianismo!

E a razão é apenas esta: a "igreja" o vê a partir das doutrinas criadas nas Escrituras, razão pela qual Ele não tem mais face única para os Seus discípulos.

Sim, Jesus ficou preso na cadeia da hermenêutica, refém de doutrinas, e encastelado no edifício teológico do híbrido judaico-cristão-grego-aristotélico.

Ora, isto faz com que aquilo que deveria ser o Corpo de Cristo, vivendo em amor e unidade, surja como uma Besta de muitas caras e chifres, e que vive e se alimenta de ódio e dês-afinidade fraterna.


Nele, em Quem me sinto autorizado a dizer o que digo,


Caio

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