Segue-me tu!
03 dezembro 2007
Amado caminhante, Paz!
Penso que urge cada vez mais uma reflexão profunda acerca dos múltiplos e profundos desdobramentos existenciais da Graça de Deus, ou seja, na ambiência em que ela acontece (ou, pelo menos, deveria acontecer), que é o coração.
Meu desejo sincero é que estejamos libertos do que denomino enquanto uma espécie de “síndrome da alteridade”, que nada mais é do que o retrato perverso de alguém que se preocupa em demasia com o outro, mas que não dá conta – ou não quer, ou algo além disso – de olhar para dentro de si mesmo, e dizer: “o que é isso que me habita”?
Neste sentido, precisamos, como diz Paul Rabinow, ser “antropologizados”, no sentido de uma postura que revele uma espécie de auto-estranhamento de nossas posturas e atitudes, ao invés de considerar que o “exótico”, o “estranho”, o “esquisito” é o outro.
Digo isso porque me pré-ocupo com posturas ditas “zelosas”, mas que, no fundo, são meros reflexos de alguém que ainda não tem o seu “passado-biográfico-eclesial-acidental” resolvido, mas vive sob a penumbra existencial de um passado, em tese supostamente “glorioso”.
Quando isso acontece, a conseqüência (i)mediata é muito patente: o auto-engano, revelado na idéia de que “já passou”, mas, na verdade, não passou é nada.
“As coisas velhas que para traz ficam” se tornam um mero chavão piegas, mas longe de se concretizarem como verdade no meu coração!
Não ficaram para traz coisa nenhuma!
Aliás, não ficam e nem poderiam ficar, vis-à-vis o ser achar que é, mas não o é, à guisa de semelhança com a auto-imagem que a igreja em Laodicéia fazia de si mesma (Ap. 3).
E isso traz angústia.
E isso des-aquieta o ser!
E isso revela que ainda há um longo caminho a ser trilhado!
E isso gera algumas expectativas em relação aos do Caminho, ou mesmo ao próprio caminho da Graça em si, que não se sustentam empiricamente. Aliás, ainda bem que assim acontece!
Portanto, antes de estranhar o que os “filhos da Graça” ouvem, falam, comportam, comem, bebem, vestem, procure simplesmente “dar conta de si mesmo” a Deus. Esta simplíssima e não menos belíssima lição da graça é tipificada exemplarmente na conversa estabelecida entre Jesus e Pedro, na qual o Senhor lhe diz, de modo escancaradamente contundente:
21 Vendo Pedro a este, disse a Jesus: Senhor, e deste que será?
22 Disse-lhe Jesus: Se eu quero que ele fique até que eu venha, que te importa a ti? Segue-me tu (Evangelho segundo João, cap. 21)
Sem tal percepção, o que vier provém – e provém mesmo! – do maligno!
Senão você cairá numa outra “patologia espiritual”, relacionada à idéia farisaica de “Graças a Deus que não sou como eles”.
“Posso até andar perto, ou até geograficamente junto”, mas....há um limite!
Pergunto: que limite é esse?
Quem o define?
Você? Talvez seja, porque eu é que não o serei!
Que ninguém se arvore - principalmente eu - do papel de "guardião da Graça", porque o Pai – e, portanto, ela - não precisa disso. E também porque, quando chamamos pra gente uma "responsa" que não nos é dada, é inexoravelmente engendrada doença da alma, e doença que nos mata, que nos fere, e que, conseqüentemente, fere a outrem.
É a raiz de amargura – uma de suas várias manifestações - travestida de uma roupagem tão sutil quanto maléfica: o tal do “zelo” de Deus.
É a doença pastoral, a qual, diga-se de passagem, nem de longe é fruto exclusivo da megalomania evangélica!
Nosso chamado é para sermos simplesmente Dele, sendo por ele alimentados, e isso me basta!
Indago: te basta? Tem lhe bastado? Mesmo?
Portanto, meu caro irmão, estas breves idéias e perguntas dispersas são um mero fruto da minha singela percepção sobre o Caminho da Graça em BH, e espero que lhe façam bem. E, principalmente, que sirvam para a jornada em Cristo, que nos conhece, e nos chama pelo nome.
Com amor e carinho,
Henrique Willer
Estação BH
Em tempo: considero muito pertinente a leitura - e não uma LEI-tura! - deste texto do Caio Fábio, escrito no início do ano, e que é-nos revelador de verdades espirituais muito importantes. Como segue no link [clique aqui para ler]