Papai: tudo foi mais que perfeito!
17 setembro 2007
Quando veio a notícia oficial de que o coração de papai tinha zerado, quem trouxe o informe foi um dos anjomeiros, o Gerilson, que se deitou sobre mim, me beijou, e disse: “Ele zerou”; e, então chorou...
[Foram 5 anjomeiros a cuidarem de papai; somente um era de igreja; os outros eram apenas tão humanos que criam pelas suas obras].
Logo depois que dei a notícias a todos, chegou o Dr. Marcel, o amigo e anjomédico. Os olhos dele estavam pra lá de tristes. Mas em mim havia outro sentimento... embora chorasse de consolação. Então o abracei e beijei, e disse: “Foi tudo perfeito. Perfeito. Tudo foi absolutamente perfeito!”.
Ora, este é o sentimento que me possui; e foi isto que disse a papai anteontem, um dia antes de sua passagem para a glória.
Naquela tarde do dia 13 ele estava agitado querendo me falar algo. Tentei ver se era a posição no leito ou qualquer outra forma de desconforto físico. Mas não era. Ele continuava tentando falar... Mas o tubo da traqueotomia não deixava.
Ora, ele tinha ficado agitado quando eu disse que já havia uma UTI disponibilizada para nós o trazermos para casa. Foi aí que ele começou a falar sem som...
Olhei fundo nos olhos dele e me deu a nítida impressão de que ele queria dizer que estava cansado.
“Pai, o senhor está cansado?” — senti que ele confirmava pelo silencio de tentativas vocais.
Então eu disse a ele que sabia que ele não tinha ido ainda porque havia prometido voltar para casa, e porque estava ainda preocupado conosco. Especialmente com mamãe e Aninha. E disse que ele ficasse tranqüilo, que ambas seriam muito bem cuidadas.
E concluí:
“O que Deus fez em todos nós durante esses quase 40 dias, foi poderoso papai. O que Ele fez em mim foi mais que maravilhoso. Papai, se o senhor quiser descansar, descanse. Tudo foi perfeito. Perfeito papai”.
Assim ele aquietou-se e parou de tentar falar!...
Passei a noite de 13 para 14 sem dormir um minuto... O Batalha informava na UTI que estava tudo bem. Mas eu não estava certo disso. Até que o Dr. Marcel [meu querido, e com quem eu tinha comido um maravilhoso bacalhau na noite anterior, acompanhado de sua esposa, Débora, e de dois amigos, Joaquim e esposa] — me ligou aí pelas 9 e alguma coisa, e disse: “Os freqüência cardíaca dele baixou inexplicavelmente. O Gama [Intensivista e cardiologista] já tentou ver um marca-passo, mas não é o caso. Mesmo dando-se a ele as drogas mais fortes o coração não responde... Apenas baixa...”.
Corremos pra lá. Mas mamãe ficou ainda desinformada... Ela já tinha levado muitos sustos, todos seguidos de milagres, mas dessa vez me parecia ser diferente, e que queria ter certeza antes de falar com ela.
Quando entramos na UTI a freqüência cardíaca estava em 44. Caía para menos de 40. Então fui e falei ao espírito dele pela fé. A freqüência subiu na hora. Foi a mais de 60. Ele em profunda serenidade.
“Pai, se o senhor cansou, não lute mais. O senhor já saiu de todas aqui por milagre de Deus e pela sua vontade de vencer apenas por nossa causa. Mas agora não precisa mais... Se seu coração está cansado e se o senhor quer ir pro Lar. Então, meu amor, vá... O Senhor está conosco!”
O coração foi baixando a freqüência...
Mamãe chegou... Falou de amor, de alegria por ter sido mulher dele, de como ele era o herói dela, de como ele era o homem mais homem e de Deus que ela já conhecera, e que ela o amaria conosco para sempre. E disse: “Descanse meu amor!”.
Enquanto isto o coração dele foi lá pra cima! Depois baixou... Então, os netos e filhas... A cada beijo de amor e a cada fala de despedida... o coração pulsava mais forte... Depois baixava...
Então todos foram solicitados a saírem...
20, 19, 18, 17, 16, 15, 14, 13, 12, 11, 10, 9, 8, 7, 6, 5, 4, 3, 2, 1, 0...
Assim, conforme a Liliam, filha de minha mana Suely, havia sonhado: “Ele vai... Mas não é assim... É como um passarinho...”.
Papai viveu e morreu com o coração!
Ele não morreu do coração. Ele partiu de coração!
Tudo o que ele operou: a próstata extirpada, a bexiga e seu divertículo do tamanho dela, os dois rins e o intestino — segundo todos os exames, estavam sequinhos, limpinhos e bons para o que haviam sofrido de intervenção.
Papai partiu em razão da paz.
Desde que ele fora arrebatado espiritualmente há quatro anos [e que ouviu palavras inefáveis, as quais não é lícito referir, sendo ilícito apenas porque é algo irreferível; pois, não há linguagem, nem código e nem cenário a ser comparado] — que ele dizia que não via a hora de partir.
Foram tantas as vezes que ele dizia que queria ir que cheguei a pedir a ele para não falar assim, pois, a mulherzinha dele, minha mãe, ficava “pensativa”...
Nós, no entanto, muitas vezes, víamos que o olhar dele estava lá. Parecia que estava de lá assistindo aqui...
Adriana disse muitas vezes: “Ela já está lá. É de lá que ele fala. É por isso que nada o abala. Ele já foi; só não foi levado!”.
Quatro anos antes...
Quando eu contei a ele que o Lukas havia partido naquela madrugada [27 de março de 2004] — ele apenas disse: “Entrou no gozo! Está mais do que bem. Eu é que ainda não fui. Mas fique bem meu filho. O nosso Luk-Luk entrou no Amor”.
Papai foi imperfeito. Mas a vida que ele buscou viver em perfeição sem nada além do amor por Jesus, o levou aonde poucos humanos chegaram. Ele ficou cheio da eternidade ano a ano. Até que certa plenitude o alcançou.
Ele, entretanto, continuou aqui, cheio de graça, carinho e atenção por todos. Atendia gente e gente... Pessoalmente vários por dia. E ao telefone?... Dezenas todo dia.
Foram quase 50 anos de entrega consciente ao Evangelho, vivendo com a intensidade de quem havia acabado de ser testemunha da Ressurreição!
Agora...
Ora, no dia 2 de julho passado mamãe fez 80 anos.
Papai, com uma sonda pendurada..., chamou minhas irmãs e programou uma festa surpresa para mamãe. E até inventou um passeio até a beira do Rio Amazonas apenas para tirá-la de casa enquanto a surpresa era montada. Quando voltaram, tudo em silencio... Abriram a porta... Casa cheia. Uma gritaria de parabéns para você!...
E ele rindo como uma criança com a alegria dela...
Ah! De fato o que eu quero é escrever a vida dele. No meu livro “Confissões” há muita coisa sobre ele e mamãe. Mas a vida de papai é feita de muitos atos apostólico.
O que posso dizer é o que disse ao Marcel na hora da morte dele: “Foi tudo perfeito. Perfeito. Tudo foi absolutamente perfeito.”.
Sim! A vida daquele sábio foi uma obra de arte.
Nele, em Quem tudo é perfeito quando se o ama,
Caio
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